Ceará
Auxílio a órfãos da Covid avança no Ceará, mas apenas dois jovens recebem benefício até agora
A Assembleia Legislativa aprovou nesta semana crédito especial de R$ 100 mil para reforçar o programa Ceará Acolhe, que prevê auxílio mensal de R$ 500 a crianças e adolescentes que perderam pai e mãe para a Covid-19. A iniciativa, lançada pelo Governo do Estado ainda em 2021, buscava ser uma resposta à devastação social provocada pela pandemia, mas até agora a execução prática ficou bem abaixo das expectativas. Segundo dados oficiais, apenas dois jovens recebem atualmente a ajuda financeira, embora a estimativa inicial fosse de alcançar centenas de famílias.
O benefício, segundo o governo, é destinado a órfãos de até 18 anos incompletos, em situação de vulnerabilidade social, e os recursos virão do Fundo Mais Infância Ceará (Femic), administrado pela Secretaria da Proteção Social. A regra é clara: além de ter perdido pai e mãe — ou o único responsável familiar —, o beneficiário precisa comprovar residência mínima de um ano no Ceará, estar inscrito no Cadastro Único e ter renda familiar per capita de até R$ 218, dentro dos critérios do Bolsa Família.
O auxílio mensal de R$ 500 não pode se acumular com pensão por morte de valor igual ou superior, medida pensada para concentrar a política nos que de fato não contam com nenhuma outra fonte de renda. Apesar disso, a adesão tem sido baixa. No levantamento mais recente, o Estado contabiliza pelo menos 386 crianças e adolescentes aptos em tese a se enquadrar no programa, sendo a maioria na Região Metropolitana de Fortaleza. A discrepância entre expectativa e realidade levanta dúvidas sobre falhas na divulgação ou barreiras burocráticas que impedem as famílias de acessar o benefício.
O cadastro, segundo a SPS, está aberto de forma permanente e pode ser realizado tanto por familiares substitutos quanto por responsáveis de instituições de acolhimento. A inscrição é feita por meio de formulário eletrônico disponível no site da secretaria, com possibilidade de apoio presencial nos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) dos municípios. Ainda assim, a burocracia e a exigência de documentos comprobatórios parecem ser entraves para que o programa ganhe alcance efetivo.
O anúncio da liberação de novos recursos pelo Executivo estadual e a aprovação na Assembleia foram celebrados como avanço, mas a baixa execução expõe uma distância significativa entre o discurso oficial e a realidade vivida pelas famílias que perderam seus provedores durante a crise sanitária. A promessa de cobertura ampla até agora não se confirmou, e os números apontam para a necessidade de ajustes na política.
No texto publicado pelo Governo do Estado, a gestão destacou que a medida representa um compromisso com a proteção de crianças e adolescentes em situação de extrema vulnerabilidade. O discurso é de prioridade social e de amparo às vítimas indiretas da pandemia. No entanto, a experiência concreta de quem tenta acessar o benefício sugere que a prioridade ainda não se traduziu em atendimento em larga escala.
Enquanto isso, familiares de órfãos seguem buscando alternativas de sustento em meio à dificuldade de acesso a programas sociais. Entidades ligadas à defesa da infância apontam que a demora na implementação prática do Ceará Acolhe pode gerar consequências diretas para a permanência escolar e a segurança alimentar dos beneficiários em potencial. A expectativa é de que, com a sanção e a entrada efetiva do novo crédito, o número de contemplados comece a crescer.
Na prática, os próximos meses serão decisivos para que o governo prove que a política não ficará restrita ao papel. O desafio é transformar o programa em benefício palpável para centenas de órfãos que ainda aguardam reconhecimento. Se o processo de inscrição se tornar mais acessível e os critérios forem devidamente ajustados, o Ceará poderá enfim garantir o amparo prometido. Até lá, a realidade segue restrita a dois jovens, em contraste gritante com o alcance projetado.